domingo, 31 de julho de 2016

Falta tempo

Foi-se a época que a gente podia se dar ao luxo de demorar nas tarefas. Por mais clichê que seja, hoje em dia a vida passa e a gente nem vê. Não vê porque tá cheio de coisa pra fazer. Não vê porque tecnicamente existe coisa - de novo - mais importante. 
Falta tempo para apreciar o céu azul num dia de sol, o mar calmo em um final de domingo, o cheiro do café que acabou de ser passado. Falta tempo pra reparar nas ruas da cidade, nas pessoas apressadas andando a nossa volta, nos novos e velhos lugares. Falta tempo pra apreciar os mínimos detalhes e se perder de um jeito bom na delicadeza de algumas satisfações. Falta tempo pra comer devagar e sentir o gosto da comida caseira. Falta tempo até pra poder almoçar verdadeiramente comida. 
Parece cada vez mais nítido que a gente corre contra o tempo pra poder aproveitar tudo. E é nessa necessidade desenfreada de correr atrás dos objetivos que a gente mais perde do que ganha. A gente perde de prestar atenção no 'insignificante' que pode fazer diferença. A gente perde de guardar detalhes, cheiros, sons e sensações. 
Talvez seja necessário - e quando digo isso acredito piamente - perder alguns minutos das vinte e quatro horas do dia pra prestar mais atenção no que acontece em volta. Desde as cores do céu a toda vitrine de salgados da padaria. Das pessoas que estão dentro do ônibus às que andam na rua enquanto ele não chega no destino final. Dos encontros com amigos às reuniões com os desconhecidos. Nas pessoas que vemos todo dia mas não prestamos atenção. É tipo aquela história que falam sobre prestar atenção. Você vê! Mas será que realmente enxerga? Você ouve! Mas será que realmente escuta? 
Estamos tão absortos nas nossas vidas e rotinas que esquecemos do resto e ficamos concentrados em resolver as questões que precisamos. Não sei você, mas eu nunca realmente estou pendente com tudo, e cada final de semana tranquilo só serve pra pensar na loucura que será a próxima semana. Não é nem uma questão de abandonar o que se faz, é só um tipo de intervalo entre as tarefas. Prestar atenção na hora de sair para o almoço. Observar no caminho de ida ou volta pra casa. Ver além do que realmente acontece enquanto a gente caminha apressado pra realizar mais alguma exigência que sociedade cobra.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Amores líquidos

A nossa vida não se tornou nada menos que uma concentração de amores líquidos. Tão líquidos que facilmente passam por debaixo de nossas pontes e tão líquidos que nem causam ressaca e abalam os pilares dessa estrutura empedrada. 
Me parece que as relações viraram um grande cardápio que se escolhe o premiado conforme o humor ou a necessidade do dia. E, você deve sempre ser o sortudo que não deseja voltar ao restaurante no dia seguinte para repetir a dose. É estranho pensar como percebi isso do jeito menos provável possível. Mas percebi. 
Respiro fundo ao lembrar da tal experiência transcendental. Porque é só isso que explica como você se sente bem só em olhar para uma pessoa que você nem sabe se é destra ou canhota. Você não sabe se ela prefere dormir de bruços ou de costas, nem imagina se ela gosta de se vestir antes do café da manhã ou prefere o inverso, mas sente um carinho e uma coisa tão boa e inexplicável quando a observa.
Eu já sabia mas nunca tinha percebido. Eu tinha todos os indícios para perceber que agora a gente procura outro amor quando não recebe de volta. E a gente tenta sempre suprir a dor de um com o carinho de outro. A gente nem sabe se funciona, mas se joga de cabeça e bota o corpo inteiro nessa relação sem sentido algum. Ou a gente simplesmente aceita outros corpos pro tempo passar mais rápido e a vida ir seguindo o curso quase normal.
É um pouco solitário escrever sobre amores transcendentais que não foram correspondidos em uma madrugada fria que os vidros das janelas sussurram com uma rajada de vento mais forte. Pode até tocar uma música mais animada no fone de ouvido, mas aquelo infinito particular de uma relação de dez dias que não existiu tem o peso do mundo nas costas.
Mas, apesar de tudo, não existe dor, sofrimento ou desejo de voltar atrás. Não existe arrependimento, nem expectativas frustradas. Existe só o pensamento em mais alguma coisa que poderia tanto ter sido quanto não foi. E não é. E não importa. 
Os textos nas redes sociais vão dizer que isso é só mais um jeito de aprender sobre a vida. Os sábios poetas falam disso nos livros como um sentimento imensurável. Eu sempre fui um misto disso até perceber que o amor é mais que tudo e qualquer coisa, e ainda sim que não é tudo e nem único. Ele tem quatro letras, poucos significados e infinitas situações e, às vezes, é só preciso ser o que se deseja ter.